Maioria do tribunal analisou caso de relógio de luxo do presidente Lula na quarta-feira (7)

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Foto: Reprodução.

A maioria do Tribunal de Contas da União (TCU) entendeu, em decisão nesta quarta-feira (7), que "não existe norma clara" na legislação que defina critérios para determinar quais são os presentes recebidos por presidentes da República que devem ser incorporados ao patrimônio público.

O argumento que prevaleceu foi o do ministro Jorge Oliveira, no julgamento referente a um relógio de luxo entregue ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2005. Com a decisão, Lula não vai precisar devolver o item.

A determinação desta quarta abre caminho para uma rediscussão, no TCU, do processo sobre as joias e armas dadas pelo regime da Arábia Saudita ao governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Em 2023, o tribunal determinou, por decisão unânime, que Bolsonaro deveria devolver um conjunto de itens de luxo de valor milionário com base em uma determinação de 2016 da Corte.

Naquele ano, após fazer uma auditoria nos presentes recebidos por Lula e a ex-presidente Dilma Rousseff, o tribunal deixou claro que objetos de valor, como joias, pertencem ao acervo público da Presidência da República.

Somente itens de menor valor, perecíveis e de caráter personalíssimo, como camisetas e bonés, poderiam ser incorporados ao acervo privado do presidente da República.

Porém, debatendo o caso de Lula nesta quarta, a maioria dos ministros seguiu o voto de Oliveira, concordando que a elaboração de uma regra clara sobre os presentes cabe ao Congresso Nacional, e não ao TCU.

No voto, o ministro defendeu: "A ausência de norma legal específica, aplicável aos Presidentes da República, embora não impeça a atuação deste Tribunal [...] afasta a possibilidade de expedição de determinação ampla e generalizada, por esta Corte, para incorporação ao patrimônio público de presentes eventualmente recebidos pelos Presidentes da República".

De acordo com ele, não há uma definição precisa do conceito de "bem de natureza personalíssima" na legislação, e nem de valor objetivo que possa enquadrar o produto como de "elevado valor de mercado".

Portanto, "não é possível impor obrigação de incorporação ao patrimônio público em relação ao bem objeto desta representação [o relógio de Lula], como também não o é em face daqueles que são escrutinados em outros processos que tramitam nesta Corte", segue o voto.

Jorge Oliveira foi indicado por Bolsonaro para o TCU, em 2020, depois de exercer o cargo de ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República.

Votaram com ele os ministros: Vital do Rego, Jonathan de Jesus, Aroldo Cedraz e Augusto Nardes.

Joias sauditas

Os primeiros indícios envolvendo o caso das joias — que terminou pelo indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro — remontam março de 2023.

As joias milionárias, avaliadas, após conclusão de perícias, em R$ 5,1 milhões, foram apreendidas pela Receita Federal ainda em 2021, porque o governo não as declarou como um presente de Estado nem pagou os impostos devidos para que os itens pudessem entrar no país como item pessoal.

Em março do ano passado, os ministros TCU determinaram, por unanimidade, que Bolsonaro deveria entregar o pacote com artigos de luxo que recebeu do regime saudita.

Após a decisão do tribunal, a defesa de Bolsonaro, então, fez entregas de kits de joias à Caixa Econômica Federal. Ao todo, foram três pacotes entregues.

Naquele mesmo mês, a Polícia Federal (PF) abriu um inquérito para investigar o caso e os envolvidos.

Em julho deste ano, Bolsonaro e mais 11 pessoas foram indiciadas pela PF na investigação. O ex-presidente é acusado de peculato — que é a apropriação de bens públicos —, associação criminosa e lavagem de dinheiro (entenda aqui os crimes).

Outros votos

Durante o julgamento desta quarta, os ministros Anastasia e Marcos Bemquerer concordaram com os demais de que a devolução não deveria ocorrer. Porém, se basearam apenas no posicionamento de que as normas não podem retroagir.

Esse entendimento não abriria brecha para rediscutir o caso de Bolsonaro.

Isso porque, o TCU só deliberou em 2016 sobre o tratamento de presentes recebidos. Essa regra vale para todos os presentes recebidos desde 2002, mas excluía os itens "personalíssimos" ou de consumo próprio.

Mais tarde, em 2023, o tribunal entendeu que mesmo os itens "personalíssimos" deveriam ser incorporados ao patrimônio da União. Como o relógio de Lula foi entregue em 2005, ele não entraria na regra.

O único ministro que votou pela devolução foi Walton Alencar, para quem a permissão do TCU para manter os presentes representaria liberar uma “remuneração incontrolada” do presidente para aumento de patrimônio pessoal.

"Não somos uma ditadura de país, em que o ditador confunde seu patrimônio com o do próprio país", declarou.

Manifestação da AGU

A Advocacia-Geral da União (AGU), órgão que presta atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo, vai recorrer da decisão do TCU.

O governo federal quer que prevaleça para na questão o entendimento de que os itens recebidos após 2016, quando a corte de contas determinou que os presentes recebidos deveriam integrar patrimônio da União, sejam devolvidos, e que essa obrigatoriedade não tenha efeito retroativo.

Um ministro próximo ao atual presidente afirma que o TCU não pode "colocar Lula no mesmo balaio de Bolsonaro". "Bolsonaro agiu de má fé. Se apropriou e vendeu os bens", afirmou ao g1, de forma reservada.

Se este argumento for aceito pelo TCU, Lula continuará sem obrigação de devolver o relógio, e a decisão do tribunal não abriria caminho para uma rediscussão do processo sobre as joias e armas dadas pelo governo da Arábia Saudita ao governo de Bolsonaro, possibilidade colocada em vista com a decisão desta quarta.

G1.

Jornalista | Palestrante | Assessora de Comunicação | Consultora em Gestão de Crise de Comunicação | Apresentadora de rádio e televisão.

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